terça-feira, 14 de abril de 2009

O Mito da caverna.... Vamos sair dela?



Para quem não conhece o mito da caverna, de Platão, vou contá-lo, resumidamente, para que o leitor possa acompanhar meu pensamento.

Imaginemos uma caverna subterrânea onde, desde a infância, geração após geração, seres humanos estão aprisionados. Acorrentados pelas pernas e pelo pescoço, estão impedidos de olhar para trás e para os lados, e tampouco podem se mexer. Só podem olhar para um ângulo, a frente. À porta da caverna há uma imensa e alta fogueira, que permite que se enxergue, lá dentro, alguma coisa.

Entre a fogueira e os prisioneiros, lá fora, há um caminho ascendente ao longo do qual foi erguida uma mureta, semelhante ao que se usa nos teatros de marionetes e fantoches. Ao longo dessa mureta, homens passam carregando estatuetas de todo tipo, com formas de seres humanos, animais e outras.

A localização da fogueira proporciona uma projeção das sombras dessas estatuetas sobre uma parede no fundo da caverna.

Os prisioneiros não sabem que existem esses homens, nem as estatuetas. O que vêem são as sombras. Como jamais viram outra coisa, eles não sabem que se trata de sombras de coisas que homens estão segurando. Também não sabem que aquela luminosidade vem da fogueira e que existe uma outra intensidade de luz. O que sabem é o que vêem, só. Sua imaginação se restringe, também, ao que eles sabem.

Platão, em suas considerações filosóficas, pergunta o que aconteceria se algum prisioneiro fosse libertado e pudesse sair da caverna. A possibilidade de se mexer, sem as correntes, de estar exposto à claridade, de enxergar os objetos em si e outros seres humanos, lhe traria um confronto com a realidade das coisas. Ele ficaria sabendo que o que via eram sombras de objetos, projetadas por uma fogueira, e não as coisas em si.

Platão ainda indaga sobre o aconteceria a esse homem, agora sabedor da realidade, se retornasse à caverna e contasse aos outros prisioneiros tudo o que viu.

Várias são as reflexões possíveis sobre o mito da caverna. Para quem desejar se aprofundar, procure A República, de Platão, mais especificamente a passagem A Alegoria, onde a idéia é mostrar o percurso do prisioneiro até transformar-se no sábio, no filósofo.

Situações de confinamento, de vendar os olhos, de restringir nossa liberdade, sempre nos atraíram, mais a uns do que a outros, pela possibilidade de conhecermos emoções e reações que só aparecem nessas condições. Nelas, nossa capacidade de percepção das coisas fica reduzida, sem que tenhamos responsabilidade sobre isso. Não suportamos muita claridade, porque ela, muitas vezes, nos cega. Imaginemos que pudéssemos enxergar tudo à nossa volta. Teríamos mente suficiente para elaborar e digerir tudo que veríamos? Certamente não.

O mito da caverna nos é útil, sob vários aspectos, para ilustrar o processo de desenvolvimento da mente e capacidade de relação com o mundo que decorre desse processo.

Quando nascemos, somos seres completamente iludidos. Enquanto somos bebês, estamos de certa forma confinados na caverna materna, crentes de que somos os únicos seres importantes que existem. Porque não conhecemos o que está à nossa volta e tampouco a metros ou quilômetros de distância, imaginamos um mundo que se resume à nossa existência. Não enxergamos um palmo adiante do nosso nariz. E precisamos acreditar, piamente, nessa ilusão de que somos poderosos e exclusivos, retendo o sentido da vida em torno de nós, para criarmos força e confiança para crescer. Tais quais os prisioneiros da caverna, estamos aprisionados pelo desejo e pela ilusão de sermos, mãe e filho, um só. O que enxergamos à nossa volta, portanto, são sombras que nos refletem.

Conforme vamos crescendo, nossa capacidade de percepção está mais desenvolvida e expandida, de modo que vamos percebendo, gradativamente, que as pessoas e as coisas não são bem aquilo que imaginávamos. Essa capacidade depende, em grande medida, de outra, que é a da tolerância.

Conforme conseguimos tolerar a idéia de que aquilo que está à nossa volta, na maioria das vezes, pode ser muito diferente do que imaginamos ou esperamos que seja, teremos mais condições de expansão, de desenvolvimento e de abertura. Estaremos assim ─ lembrando a metáfora da caverna ─ caminhando em direção à saída, tornando-nos menos aprisionados nela. Em outras palavras, estaremos menos iludidos, e menos onipotentes também. Agora, se não suportamos pensar que existem muito mais coisas além da nossa existência e daquilo que imaginamos, então ficamos enfurnados dentro da caverna materna (ou de Platão), com uma visão, digamos, pequena e parcial sobre a vida. É como se nos iludíssemos com as sombras das coisas, acreditando que elas representam verdadeiramente a realidade.

Existem ditados populares que expressam bem as dificuldades dessa situação: "A verdade dói" ou "O que os olhos não vêem o coração não sente". É para escapar do sofrimento que, muitas vezes, não queremos enxergar a realidade ou saber sobre a verdade das coisas. Preferimos, nesses casos, ficar cegos a ter que enxergar aquilo que fere nossas ilusões. O sofrimento decorre da constatação de que não somos onipotentes. Isso exige de nós um grande trabalho mental, porque tendemos a escorregar desse ponto para um outro ─ extremo ─ onde passamos a nos sentir inferiores e humilhados. De poderosos a impotentes. Um trabalho de elaboração mental é importante para encontrarmos um lugar que não está nem em um extremo nem em outro, mas, sim, num lugar flexível onde reconhecemos ter capacidades e limitações. É o lugar do humano.

O crescimento, portanto, seguindo a analogia da caverna de Platão, seria um longo caminho, que todos nós percorremos e que começa no prisioneiro e termina no sábio. Estarmos mais, ou menos, presos às ilusões nos dá as medidas de nosso ajuste, que pode ser maior ou menor, à realidade da vida.

Fonte : Blog  MySticatyler 

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